Saio de casa ao volante de um Hyundai i20 com motor 1.2 a gasolina para o devolver à concessão que o cedeu para teste, transitando para o meu Mercedes 200D de 1989, equipado com nada ecológico motor a gasóleo de dois litros. Ao fim de cerca de meia hora de viagem, estaciono a minha preciosidade em casa e espero cinco minutos pela minha boleia, que chega num Lexus RC híbrido. Peço para guiar, pois não conhecia o automóvel. Minutos depois, paramos junto à garagem da BMW, onde me aguarda um 730d, equipado com evoluída mecânica a gasóleo. É ao volante do topo de gama da marca alemã que nos dirigimos ao coração de Lisboa, onde uma responsável da Tesla me aguardava com o Model S 100D. Ufa, em cerca de uma hora, percorri quase todos os tipos de propulsão para automóveis existentes no mercado (faltou o GPL) e quase 30 anos de história automóvel!
Mas voltemos ao meu encontro com o Tesla. Confesso que, à data, estava um pouco distante em relação aos modelos da marca norte-americana. Conhecia os princípios básicos de funcionamento, mas não dominava o tema a fundo, até porque nunca tinha conduzido nenhum. Sabia que eram capazes de acelerações fantásticas, mas sempre achei que isso causaria algum mal-estar. Há uns anos, guiei o protótipo Audi R8 e-tron, equipado com um motor elétrico em cada roda, e cada aceleração a fundo causou-me náuseas, tal era a quantidade de G’s a empurrarem o meu cérebro contra o crânio.
Bom, mas posso afirmar que parti para esta experiência com a mente aberta e só terei referido uma ou duas vezes a amigos próximos que na semana seguinte ia guiar um frigorífico com rodas. Juro que não foram mais do que duas. A responsável da Tesla esteve cerca de 20 minutos a explicar-me tudo sobre o carro. Senti-me quase como se de repente me tivesse colocado a bordo de uma nave espacial e me estivessem a explicar os comandos para levar a nave a Marte e voltar. Curiosamente, há uma função no Tesla que mostra a superfície de Marte... No fim da explicação, confesso que estava um pouco apreensivo. A menina deixou o carro e eu fiquei durante alguns segundos a assimilar toda a informação. Quando consegui deixar de olhar para o ecrã central que é maior que o ecrã do computador que tenho em casa e que quase nos hipnotiza, olhei para baixo e vi dois pedais. Depois, olhei em frente e havia um volante. Por trás do volante havia uma manete que servia de comando da caixa. Coloquei a coisa em «D» e levantei o pé do travão. Três metros, dez, 20… e o Tesla continuava com as rodas coladas ao chão. Afinal, aquilo não ia levantar voo. Mais: guiava-se como qualquer outro carro, elétrico ou não.
Após dois ou três quilómetros em que não resisti a pisar o acelerador a fundo meia dúzia de vezes à procura, em vão, da aceleração que me levasse à náusea, parei o carro para explorar o ecrã de 17’’. Depressa encontrei os dois modos de condução disponíveis: Chill e Standard. Tinha vindo a utilizar o Chill que, embora, puxasse bem, não dava aquele esticão de que tinha ouvido falar. Percebi depois que neste modo (cuja tradução em português é qualquer coisa como descontraído), a aceleração está limitada para oferecer uma condução suave e leve. Não era mesmo nada disso que vinha à procura num carro que me foi apresentado como uma nave espacial, pelo que alterei a regulação para o modo standard, que garante o nível normal de aceleração.
Procurei uma estrada vazia atrás de uns barracões nos arrabaldes de Lisboa e foi aí que fiz a coisa como deve ser: pé esquerdo no travão, pé direito a fundo no acelerador e vuuuuummmm… A náusea não aconteceu, mas senti os G’s a empurrarem-me contra o banco e o cérebro às cambalhotas. E só não se sente mais porque o Tesla é um automóvel muito bem insonorizado e confortável, filtrando quaisquer imperfeições da estrada. Achei até que será demasiado filtrado, oferecendo reduzido feeling de condução. E de tal forma assim é que não resisto a fazer desde já uma comparação: a um Classe S da Mercedes ou a um Série 7 da BMW, o Tesla Model S é menos confortável, tem interior com menos qualidade e muito menos refinado e não há comparação possível no que toca à dinâmica...
A falta de agilidade é flagrante, sobretudo em curvas sucessivas, pois o eixo traseiro fica a flutuar, o que será eventualmente uma reação potenciada pela suspensão pneumática, pois até em oscilações ligeiras se sente alguma ondulação. Claro que assim que a direção está apontada para a saída da curva, o carro sai disparado como uma bala, mas isso não ameniza a falta de intensidade. Sensações fortes há, claro, sobretudo pela elevada velocidade que atinge rapidamente em reta ou à saída das curvas, mas nunca pela reatividade do chassis ou pelo feedback da direção, cuja assistência pode ser regulada (modos Comfort, Normal e Sport), mas a verdade é que não senti mudança significativa de sensibilidade em nenhum dos modos, sendo sempre difícil de perceber o que se passa com as rodas dianteiras.
Viagens longas em conforto, em silêncio e com grande economia, eis o que o Tesla me inspira. Ah, claro, sem esquecer uns arranques para impressionar a malta. Sim, porque ao fim de meia dúzia de arranques, esgota-se a piada da patada no acelerador, pois isso só contribui para diminuir o maior trunfo deste Tesla Model S 100D: a inexistência do fator angústia da autonomia.
Nesta versão, a bateria tem 100 kWh de capacidade, oferecendo uma autonomia anunciada de 623 km. Não os faz, para tal seria preciso reunir uma série de condições muito específicas, mas consegue-se fazer entre 480 e 530 km com a carga a 100%, isto sem abusar dos arranques... O carregamento pode ser efetuado em casa, sendo que com uma wallbox (carregador de parede), a bateria carrega até 80 kWh; nos carregadores públicos convencionais ou nas duas redes de carregamento que a Tesla está a expandir em Portugal e que já existem por toda a Europa: os supercarregadores (há cinco em Portugal), que em 20 minutos carregam à volta dos 250 km, ou o «Carregamento no Destino», que replicam o que se faz em casa numa wallbox (carregam até 80 km de autonomia por hora). Há já mais de 100 pontos destes em Portugal, entre hotéis, resorts e restaurantes.
Por fim, tratando-se de um Tesla, é indispensável falar da condução autónoma. O sistema Auto Pilot que equipava a unidade que testei é de segunda geração, sendo capaz de controlar o cruise control e a direção, mudar de faixa quando ativamos o pisca e estacionar sozinho. Em autoestrada, funcionamento irrepreensível, ainda que tenha sido a custo que larguei o volante totalmente. Contudo, ao fim de alguns quilómetros, deixei-me guiar, exagerando na utilização do tablet gigante e na conversa com quem viajava nos bancos traseiros, inclusive deixando de olhar para a estrada por meia dúzia de segundos...