O Estado tem muitos telhados de vidro. Conhecemo-los quase todos. Também por isso, aos responsáveis governamentais e da administração pública, mediaticamente, exige-se moderação e sensatez, não demagogia e populismo que confundimos com ignorância/impreparação. Matos Fernandes, o Ministro do Ambiente e da Transição Energética, arriscou e excedeu-se quando antecipou o fim, no curto prazo (quatro anos), dos motores a gasóleo, surpreendendo os agentes do setor automóvel e desinformando os consumidores, com argumentos falsos.
Se Matos Fernandes olhasse para dentro de casa, seria mais prudente. O PÚBLICO leu o relatório do Parque de Viaturas do Estado (PEV) no final de 2017 e concluiu que 73% das viaturas da administração pública, direta e indireta, incluindo gabinetes ministeriais, são a gasóleo. Então, na frota, existia apenas um veículo a gás, 17 híbridos e 55 elétricos. A média das idades dos automóveis, em vez de diminuir, aumentou, de 12 anos em 2010 para 15,3 em 2017, por falta de renovação – e só 11% das viaturas tinham menos de quatro anos!
O Estado comporta-se (muito) pior do que os consumidores. Em Portugal, a idade média do parque automóvel (considerando-se só os ligeiros de passageiros) é de 12,6 anos, mas existem 700.000 viaturas em circulação com mais de 20 anos, consequência direta do «não» de Matos Fernandes à reintrodução do incentivo ao abate de veículos. E, assim, nas estradas, cada vez mais carros velhos, que consomem mais combustível e emitem mais emissões poluentes do que os modernos, independentemente dos motores. Mas, nenhuma surpresa: o Governo também não cumpriu o despacho de 2014 que fixava as quotas de CO2, comprando/alugando menos viaturas ecológicas do que pretendia – os mais poluentes representaram 39% das 277 aquisições em 2017, acima do máximo permitido, de apenas 5%.
O relatório de 2017 não integra compras posteriores, incluindo as do Programa de Apoio à Mobilidade Elétrica na Administração Pública (ECO.mob), que prevê a substituição de 1200 viaturas com mais de 10 anos por carros elétricos, na administração pública, até 2020. Ainda recentemente, na cerimónia de entrega de 55 modelos com a tecnologia de futuro mais distante do que próximo, Matos Fernandes, disse que «o Estado deve dar o exemplo», mas o peixe morre pela boca: nos concursos públicos para aquisição/aluguer de viaturas, continua a admitir-se o Diesel. Sim, senhor Ministro, contrassenso!